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quarta-feira, agosto 06, 2008

Fábula da vaquinha e do precipício



Era uma vez, numa terra distante, um sábio chinês e seu discí­pulo.
Certo dia, em suas andanças, avistaram ao longe um casebre.
Ao se aproximar, notaram que, a despeito da extrema pobreza do lugar, a casinha era habitada.
Naquela área desolada, sem plantações nem árvores, viviam um homem, uma mulher, seus três filhos pequenos e uma vaquinha magra e cansada.
Com fome e sede, o sábio e o discí­pulo pediram abrigo por algumas horas.
Foram bem recebidos.
A certa altura, enquanto se alimentava, o sábio perguntou:
- Este é um lugar muito pobre, longe de tudo. Como vocês sobrevivem?
- O senhor vê aquela vaca? Dela tiramos todo o nosso sustento - disse o chefe da famí­lia. - Ela nos dá leite, que bebemos e também transformamos em queijo e coalhada. Quando sobra, vamos à cidade e trocamos o leite e o queijo por outros alimentos. É assim que vivemos.
O sábio agradeceu a hospitalidade e partiu.
Nem bem fez a primeira curva da estrada, disse ao discí­pulo:
- Volte lá, pegue a vaquinha, leve-a ao precipí­cio ali em frente e atire-a lá pra baixo.
O discí­pulo não acreditou.
- Não posso fazer isso, mestre! Como pode ser tão ingrato? A vaquinha é tudo o que eles têm. Se eu jogá-la no precipí­cio, eles não terão como sobreviver. Sem a vaca, eles morrem!
O sábio, como convém aos sábios chineses, apenas respirou fundo e repetiu a ordem:
- Vá lá e empurre a vaca no precipí­cio.
Indignado porém resignado, o discí­pulo voltou ao casebre e, sorrateiramente, conduziu o animal até a beira do abismo e a empurrou.
A vaca, previsivelmente, estatelou-se lá embaixo.
Alguns anos se passaram e durante esse tempo o remorso nunca abandonou o discí­pulo.
Num certo dia de primavera, moí­do pela culpa, abandonou o sábio e decidiu voltar àquele lugar.
Queria ver o que tinha acontecido com a famí­lia, ajudá-la, pedir desculpas, reparar seu erro de alguma maneira.
Ao fazer a curva da estrada, não acreditou no que seus olhos viram.
No lugar do casebre desmazelado havia um sí­tio maravilhoso, com muitas árvores, piscina, carro importado na garagem, antena parabólica.
Perto da churrasqueira, estavam três adolescentes robustos, comemorando com os pais a conquista do primeiro milhão de dólares.
O coração do discí­pulo gelou.
O que teria acontecido com a famí­lia?
Decerto, vencidos pela fome, foram obrigados a vender o terreno e ir embora.
Nesse momento, pensou o aprendiz, devem estar mendigando em alguma cidade.
Aproximou-se, então, do caseiro e perguntou se ele sabia o paradeiro da famí­lia que havia morado lá há alguns anos.
- Claro que sei. Você está olhando para ela - disse o caseiro, apontando as pessoas ao redor da churrasqueira.
Incrédulo, o discí­pulo afastou o portão, deu alguns passos e, chegando perto da piscina, reconheceu o mesmo homem de antes, só que mais forte e altivo, a mulher mais feliz, as crianças, que haviam se tornado adolescentes saudáveis.
Espantado, dirigiu-se ao homem e disse:
- Mas o que aconteceu? Eu estive aqui com meu mestre uns anos atrás e este era um lugar miserável, não havia nada. O que o senhor fez para melhorar tanto de vida em tão pouco tempo?
O homem olhou para o discí­pulo, sorriu e respondeu:
- Nós tí­nhamos uma vaquinha, de onde tirávamos nosso sustento. Era tudo o que possuí­amos, mas um dia ela caiu no precipí­cio e morreu. Para sobreviver, tivemos que fazer outras coisas, desenvolver habilidades que nem sabí­amos que tí­nhamos. E foi assim, buscando novas soluções, que hoje estamos muito melhor que antes.

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